MARIA CONCEIÇÃO ARRUDA TOLEDO
S A U D A D E
Não tenho saudade do tempo passado,
nem do frescor da juventude perdida:
pele louçã, longos cabelos soltos ao vento,
olhos brilhantes encarando sem medo o futuro.
Tenho saudade da vitalidade física
com que desempenhava tantos misteres.
Tenho saudade da brutal coragem
com que enfrentava meus limites
no desempenho de árduas tarefas,
e lutas contra obstáculos e preconceitos
antepostos a meus objetivos.
Tenho saudade da firme determinação
quase obsessiva, para recuperar um tempo
a contra-gosto perdido, que ficou lá atrás,
afastando-me de conquistas, sonhos, ideais.
Pergunto-me: se tivesse vivido a vida
"em branca nuvem" teria tido garra
e coragem suficiente para chegar até aqui ?
Conquistado o pouco com que me contentei ?
Ou, como a grande maioria de pessoas,
acomodadas a um viver diuturno triste,
sem motivação, sem grandes alegrias,
paupérrima de espírito e calor humano ?
Tenho saudade das batalhas enfrentadas,
das homéricas brigas em família
sempre compensadas após a calmaria.
Envelhecida, debilitada e só
recordo-me com saudade de noites
mal-dormidas e dias trabalhosos
que me diziam não ser fácil viver.
No entanto, vivi mil vidas
nas nove décadas
de uma existência produtiva.Por isso, só tenho saudade,
muita saudade de mim !
O que dizer? a não ser uma palavra simples: Sensacional! Com noventa anos e ainda com um vigor extraordinário!
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